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Extrema-direita em África: realidade, retórica ou alerta estratégico?

Durante a recente Cimeira dos Movimentos de Libertação da África Austral, o Presidente da Frelimo, Daniel Chapo, levantou um alerta que merece atenção: segundo ele, a extrema-direita está a crescer em África, com uma agenda oculta de desarticular os partidos históricos, instalar governos fantoches e facilitar o saque de recursos naturais.
Mas será que este fenómeno é real, ou trata-se de uma construção política para consolidar o poder das elites históricas?



Movimentos de libertação e o poder herdado

É inegável que partidos como a Frelimo (Moçambique), o ANC (África do Sul), a ZANU-PF (Zimbábue), o MPLA (Angola) e a SWAPO (Namíbia) tiveram papéis centrais na luta contra o colonialismo. Durante décadas, estas formações foram vistas como símbolos de resistência e esperança.
No entanto, muitos destes partidos transformaram-se em máquinas burocráticas, com estruturas fechadas e dificuldades em se adaptar às exigências de novas gerações.

A suposta ascensão da extrema-direita africana

O conceito de “extrema-direita” aplicado ao contexto africano merece cautela. Em muitos casos, os grupos rotulados como tal defendem causas como o combate à corrupção, a descentralização do poder e a reforma da administração pública. Alguns são liderados por jovens descontentes com os modelos de governação herdados das independências.
É evidente, contudo, que há interesses estrangeiros atentos aos processos eleitorais africanos. A crescente influência de think tanks, fundações internacionais e redes de comunicação digital pode, de facto, facilitar a manipulação da opinião pública, principalmente em contextos de frustração económica.

Governos fantoches e a guerra pelos recursos

Chapo alertou para a tentativa de instalar "governos fantoches" em África com o objectivo de facilitar a pilhagem de recursos. Historicamente, o continente tem sido vítima de extracção predatória de riquezas, por via de empresas multinacionais e acordos desequilibrados.
O medo de uma nova colonização — agora económica — é legítimo. Contudo, os próprios partidos de libertação têm de assumir a sua quota de responsabilidade por contratos lesivos, má gestão de fundos públicos e falta de fiscalização.


Povo versus partido: a erosão da confiança

O verdadeiro problema pode não ser o “crescimento da extrema-direita”, mas sim a crescente separação entre os partidos históricos e os povos que os elegeram. A juventude, em particular, sente-se desamparada face ao desemprego, à exclusão social e à falta de oportunidades.
Essa separação abre espaço para novas vozes e projectos políticos que, embora nem sempre bem organizados, procuram responder a esta lacuna de representação. Se os partidos libertadores não renovarem a sua base e práticas, correm o risco de serem ultrapassados — não pela extrema-direita — mas pela história.


Conclusão: mais do que um alerta, um sinal de urgência

As palavras de Daniel Chapo são um alerta, mas não devem ser um escudo contra a crítica interna. Se os partidos libertadores quiserem continuar a representar os seus povos, precisam de se reinventar, ser mais transparentes, mais abertos e mais eficazes na resolução dos problemas reais.
Culpabilizar forças externas não pode substituir a introspecção e a responsabilidade interna. Porque em África, a verdadeira luta continua: a luta pela dignidade, pelo desenvolvimento e pela soberania das nações — mas também das consciências.

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